José de Alencar, sobre a literatura:

"Palavra que inventa a multidão, inovação que adota o uso, caprichos que surgem no espírito do idiota inspirado".
Benção Paterna, 1872 - tem coisas que não mudam.




sexta-feira, 29 de abril de 2011

Uma poesia para a mulher de Praia Grande (a que pôs a filha na caçamba de lixo)

Todo crime deve ser punido `a luz da justiça e da lei dos homens, mas há crimes que já vêm com o castigo.



Ninguém jamais verá
a dor do predador
que esfola a própria cria
e se arrasta verme
no rastro da noite imberbe
sem jamais sonhar
com o romper do dia.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Na poesia o homem adquire a consciência de ser algo mais que passagem.

Soneto do Amor Total
Vinícius de Moraes

diplomata, dramaturgo, jornalista, poeta e compositor carioca
Morreu no Rio de Janeiro, aos 67 anos, em 1980.


Amo-te tanto, meu amor, não cante
O humano coração com mais verdade
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade

Amo-te afim de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade
Amo-te enfim com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Mas com um desejo maciço e permanente

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia, em teu corpo, de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.


terça-feira, 26 de abril de 2011

A rosa do dia (ou Elogio à Ambiguidade)

O sol bate
O vento bate
E a rosa fica só espinhos.

Pílulas de Poesia

Essa semana vou postar a cada dia uma poesia de um autor que eu amo.
Vai ter no blog, como tem dentro de mim: de Zé da Luz e Patativa do Assaré até Fernando Pessoa e William Shakespeare. Sendo que, vale grifar, Zé da Luz vem primeiro.
Pois eu estou mais para baião do que para rock and roll. E estou toda prosa (e verso).
Respeito sua aldeia, respeito qualquer aldeia, mas sou mais nós de lá de casa!
E hoje, respeitável público, tem Zé da Luz!

As 3 flô de Puxinanã (Puxinanã é uma cidade da Paraíba, perto de Campina Grande)

Zé da Luz

Zé foi um alfaiate e poeta paraibano; morreu no Rio de Janeiro, aos 60 anos, em 1964.

Três muié , três irmã

Três cachorra da molesta

Que eu vi num dia de festa

Num lugá Puxinanã

A mais véia, a mais ribusta

Era mesmo uma tentação

Mimosa flor do sertão

Que o povo chamava Augusta.

A do meio, a Guilhermina

Tinha uns ói que ô mardição

Matava qualquer cristão

Os oiá dessa menina

Os ói dela parecia

Duas estrela se tremendo

Se apagando e se acendendo

Em noite de ventania

A terceira era a Maroca

Tinha um corpo muito mar feito

Mas porém tinha nos peito

Dois cuscuz de mandioca

Dois cuscuz que por capricho

Quando ela passou por eu

Minhas venta se acendeu

Com o cheiro vindo dos bicho

Eu inté me trapaiava

Sem saber das 3 irmã

Que eu vi em Puxinanã

Qual era a que me agradava

Iscuiendo a minha cruz

Para sair desse imbaraço

Desejei morrer nos braço

Da dona dos dois cuscuz.


domingo, 24 de abril de 2011

Para mim, vida é o que acontece na minha alma enquanto eu escrevo. E escoa.

A lua corre lá fora
Assaz alta para que eu a toque
A vida corre lá fora...

A cera suporta o débil balé da ardente flama
enquanto com lágrimas febris reclama
a sua própria extinção.

sábado, 23 de abril de 2011

Zorba e o machismo latino

“Escrevo para me livrar da emoção” (TS Elliot).

Tenho por hábito, quase religioso, revisitar os clássicos. E foi assim que reencontrei “Zorba, o grego”. Os críticos o definem como uma parábola sobre a força da amizade. Mas o que eu vejo nesse filme é outra coisa. A história da bela e improvável amizade entre um rico escritor inglês e seu empregado camponês que decidem dançar juntos na praia me deixou desconfortável. A cena da dança é linda e estranhamente vem depois de eles praticamente causarem a morte por apedrejamento de uma mulher e se arruinarem financeiramente. Eu chorei muito. Não pela poesia da dança, nem pela morte, nem pela empatia com a bancarrota dos protagonistas. Chorei porque não perdi de vista o fato de eu ser uma mulher.

Zorba (um inesquecível Anthony Quinn), infelizmente, abre a boca, em close, para falar das mulheres. Diz que as ama “porque elas são pobres e fracas criaturas… uma mão no seio e elas lhe dão tudo que têm.” Obviamente o grifo das palavras é meu, como se fosse necessário enfatizar o teor do que foi dito e mostrar o caminho do meu inevitável sentimento de desconforto.

Luiz Fernando Veríssimo, na crônica “Homem que é homem”*, fala que existe “um componente de misoginia patológica inerente à jactância sexual do homem latino”. Concordo plenamente, mas completaria: é necessário afirmar que toda misoginia é, por si só, uma maluquice. Um absurdo que dispensa qualquer adjetivo negativo que o desqualifique. Claro que Veríssimo colocou assim à guisa de mote para a sua criação ficcional.

Veríssimo não ofende. Diverte. Mas o filme, do qual também sou fã, além da frase emblemática do protagonista, tem ainda outro viés misógino: as personagens femininas são tratadas com evidente desimportância e superficialidade. A prostituta francesa decadente sem nenhum senso de nada. A frágil e sexy viúva da aldeia… Ambas dignas apenas de pena. Pior é pensar que isso não é totalmente ficção. Nem essas mulheres, nem o apedrejamento, nem as palavras de Alexis Zorba. Elas não são a voz do escritor. É uma fala verdadeira, que cabe à personagem.

Vi vários críticos falarem de “Zorba”, mas nenhum era mulher. Nenhum falava de misoginia. Poucos apenas resvalavam no assunto do machismo no filme. Que Zorba tem essa latinidade machista à qual Veríssimo se referia é evidente. Que as mulheres do filme são fracas e vazias, inegável. Mas isso infelizmente é apenas um retrato de uma realidade que mistura anacronismo com contemporaneidade. Tão surreal que até parece pura ficção.


quinta-feira, 21 de abril de 2011

Leitura pela fechadura

Adoro ler, então resolvi escrever sobre o que se diz do ato de ler. Não aquele discurso correto, mas manjado, tipo conselho paterno ou cobrança de professor. Quis saber das outras falas, dos outros benefícios. Quis enxergar do farol e pela fechadura. E achei umas pérolas.

Ler faz bem ao coração. Você sabia? Pois é, um pesquisador britânico comprovou que ler por 10 minutos diminui os batimentos cardíacos e reduz o estresse. Verdade científica. Se alguém duvida, saiba que os resultados dessa pesquisa podem ser facilmente replicados, e em seu benefício, na sua cama: deite-se confortavelmente sobre um travesseiro volumoso, pegue um bom livro (dê preferência aos meus- risos), ajuste a luz e vá. Se deixe levar e verá o milagre.

Ler, logicamente, faz bem ao cérebro. Mas veja que diferente. Claro, teses já foram escritas sobre a função pedagógica, social e terapêutica da leitura. Também é inegável o papel relevante do nível de letramento na função cognitiva e até na prevenção do Alzheimer. Afinal já dizia Darwin: o que você usa desenvolve e o que você não usa atrofia. Mas afirmar que um determinado livro de ficção pode ajudar efetivamente no tratamento de neuroses parece uma velha novidade: faz todo sentido. Prescrever um determinado livro com o intuito de favorecer a recuperação de eventos como perder o emprego, romper com o namorado ou perder um parente é a proposta da Biblioterapia, que alia psicólogos e bibliotecários em torno das mazelas do sofrimento humano. É que a ficção desvia a atenção e alivia o “eu” da pessoa que se entrega, identificada com a personagem. Assim sendo, textos didáticos, informativos e de auto-ajuda não são considerados biblioterapêuticos, na medida que não permitem essa vivência de tensão irreal, explosão do conflito e catarse. Um alívio para o meu bom senso que já intuía isso há tempos.

Ler até ajuda a ser feliz. E esse é o foco. Da busca pela magreza ao esnobismo intelectual, tudo se resume a tentar ser feliz. E para isso, é preciso primeira e ordinariamente estar presente no momento, no agora. Mas todo mundo já passou por fases em que ficamos sempre em qualquer lugar, menos onde estamos, ou em qualquer outro tempo, exceto no já. Estamos com os filhos pensando que precisamos de mais tempo com o marido, estamos com o marido com culpa porque deveríamos ter dado mais atenção às crianças, estamos no trabalho pensando nas férias e assim por diante . O caso é que fugir do agora é a verdadeira receita para o estresse e para a infelicidade, porque a vida é isso aqui e os problemas só são resolvidos no tic-tac do relógio. Um segundo por vez. A pessoa (que nunca está onde está) costuma estar presa nos seus próprios pensamentos, repetitivos, estéreis. Geralmente critica e racionaliza demais, tudo. “ Ele disse isso, querendo dizer aquilo e fez isso porque...” Não! Não pense demais: para a gente se encontrar é preciso se afastar um pouco, neste caso sair de dentro de nós mesmos. Embarcar no enredo de uma boa história ou num pacote de palavras escolhidas a dedo nos leva para longe. Um bom livro é capaz de nos afastar terapeuticamente e sem efeitos colaterais dos pensamentos que nos atravancam. Isso faz a gente poder voltar com mais energia para nós mesmos, como um elástico tencionado na direção certa. A da felicidade.

Em resumo, meus amigos, ler é quase uma panaceia. Então posso prescrever leitura, uma vez ao dia, ao deitar, certa dos benefícios para pacientes e impacientes. É interessante poder enxergar a literatura como uma bicicleta ergométrica distraindo e oxigenando o cérebro, promovendo um melhor ajuste do nosso foco, nos levando aos trilhos que vão dar a volta por cima. Ou como uma massagem de espírito: ler gostoso na cama ajuda a dormir melhor, relaxar a mente e o corpo e ficar menos ansiosa. Menos propensa a atacar uma caixa de bombons de chocolate. Uma conclusão super in: ler pode lhe deixar magra! Risos Rir também faz um bem danado, mas isso já é outra história.

Para quê esse blog?

Para ser feliz. Eu explico.

Você já sentiu o ímpeto de citar uma frase de um pensador numa conversa de bar? De recitar um poema? E teve medo de "pagar mico"?

Pois este é o seu blog.

Era assim que eu me sentia, antes de encontrar a minha turma de escritores/leitores, aí pensei em compartilhar esse amor também pela internet.

Ler pode deixar de ser somente um prazer solitário, para ser também uma alegria compartilhada, um estímulo ao encontro.

Mas para quem ainda não gosta de ler ou de escrever, este também é um blog ultra-recomendado, pois aqui vai achar textos elaborados com o máximo de cuidado na escolha do tema e das palavras. E boa leitura é como exercício físico: luxo e obrigação na rotina dos indivíduos do século XXI.

O Ensaio sobre Leitura é como uma experiência, um espaço para se conhecer e se reconhecer. Ler e postar. Afinal quando alguém diz: "Vá procurar a sua turma!" apenas está lhe aconselhando a buscar ativamente a felicidade.

Entre e fique `a vontade. A casa é sua.

beijos

Nina