José de Alencar, sobre a literatura:

"Palavra que inventa a multidão, inovação que adota o uso, caprichos que surgem no espírito do idiota inspirado".
Benção Paterna, 1872 - tem coisas que não mudam.




quarta-feira, 8 de agosto de 2012

A perspectiva múltipla é a matéria da paz e outras descobertas óbvias


Diante do Instante e do Outro


Por Nina Maniçoba Ferraz - FLIP - Feira Literária Internacional de Paraty - 2012
texto publicado no Portal Garapa Paulista. 
“Um festival de literatura é um antídoto poderoso contra o ódio e o fanatismo”, disse Liz Calder, presidente, criadora e apaixonada da Flip. Esse poder é o da literatura.
Afinal, “a salvação do mundo só pode vir pela cultura”, palavras do escritor sírio Adonis. Não adianta mudar os governos, nem acabar com as pragas, nem com as doenças, nem mesmo saciar a fome. O homem saudável, bem alimentado, ilustrado, que elege seus líderes democraticamente elege também os seus demônios e vai à guerra contra o outro.
Esse "outro" é feito espectro pelo que nos distancia, pelo que nos afasta, pelo estranhamento. A identidade, nesse sentido, como senso de pertencimento a um grupo, é como uma arma: é a alquimia potencialmente explosiva da alma individual (-ista) das coletividades… a engendrar o assassinato e a guerra. Essa identidade de grupo forma “identidades assassinas” ou justifica o “nós contra eles”, nas reflexões de Adonis e do norte-americano Teju Cole, respectivamente em suas mesas sobre Liberdade e Exílio.
A literatura nos une porque nos desvela. O mais importante numa aula de literatura, segundo o próprio Cole, é fazer o aluno se questionar: “quem é esse nós?”. Entender a farsa, o engodo deste nós. Francês ou árabe? Nordestino ou paulista? Quem é você?
Sua mãe é sua pátria? Sua mãe é sua lingua? “Eu arremesso a minha língua e procuro me certificar que nada fique intacto”, não sei de quem é essa frase, mas ela é tão minha. Acredito nisso. A literatura tem esse papel de fazer abalar as certezas. E a perspectiva múltipla é a matéria constitutiva da paz.
Então a literatura salva. Uma função da literatura é amainar as fronteiras, aproximar o outro, fazer conhecer o outro na sua profundidade. A boa literatura é a literatura dos humanos, vertical, que expõe as individualidades e o pitoresco para acentuar o universal e fundar a humanidade. Conhecer o outro salva. E está salvo o eu também, além do outro. 
Tudo na Flip é alumbramento, cintilação. É puro prazer esse jorro de luz e ideias. Mas que pena, posto que é luz, acho que me foge às palavras.